top of page

Cartas

  • Foto do escritor: Beatriz Pereira
    Beatriz Pereira
  • 14 de ago. de 2022
  • 2 min de leitura
Escrevo cartas. Não sei para quem. Nem sei para quê. Algumas são entregues dentro de simples e bonitos envelopes, enfeitados com Margaridas secas… Outras são guardadas nos muitos cadernos que ocupam os meus armários, ou esquecidas numa folha de rascunho no fundo de uma gaveta. O que importa é o ato de escrever, de passar o que penso e sinto para o papel, dirigindo-me a ti, a Alguém. Afinal, para quê escrever se não para o outro? Pouco interessa que as minhas cartas tenham sido esquecidas no fundo de uma mochila, porque o mais importante já foi feito: já as escrevi. O ato da leitura é secundário - uma parte opcional que pode, ou não, vir a ser cumprida.

Esta foi lida. E foi para o João, um desconhecido.



Muitas têm sido as perguntas sobre o que escrevo. O que é isso de escrever? Por que razão as palavras cuidadas que escolho nesta carta que te dirijo têm mais conteúdo, essência artística que as simples mensagens, carentes de pontuação e maiúsculas, que eu envio?


Isto é algo que me faz alguma impressão, sabes, João? Tenho um dilema constante acerca da arte que produzo… Por um lado, considero que tudo é arte, se o artista assim o desejar. Por outro, por que hei-de querer considerar artístico algo com o qual estou insatisfeita? Não estou certa que outras pessoas possam intitular de “arte” aquilo que eu própria considerei não estar à altura dessa nomenclatura. Que legitimidade têm esses outros para o fazer?


O que achas? Depende a obra do artista? E se o artista mudar a sua perspetiva com a passagem do tempo? Qual é a opinião que prevalece: a mais recente ou a que foi pronunciada aquando da feitura da obra?


Hoje não estou com capacidade para encontrar respostas, como deves ter percebido. É mais fácil fazer questões - sempre.


Costumo manter estas reflexões na minha gaveta… Relê-las alguns anos mais tarde é sempre divertido. Às vezes, as minhas visões alteraram-se profundamente e o que sinto é um autêntico desapego pela pessoa que fui. Mas noutras, admiro profundamente o cérebro de quem escreveu aquelas palavras. Não sinto que tenha sido eu, mas foi definitivamente alguém que compreendo.


Não penses, contudo, que todas as folhas perdidas são desabafos intelectuais sobre o valor da arte, a importância do tempo ou a influência ido capitalismo na nossa (in)felicidade. Muitas delas são jorros de pensamentos. Sobre amigos. Sobre amantes que crio na minha mente, ou que recordo carinhosamente. Sobre coisas que quero que façam mais sentido.


E tu, João? Como são as tuas cartas?

Bea

Comments


bottom of page